O SINTAB denuncia a tentativa de transformação do traço social e político dos Trabalhadores da indústria conserveira por parte dos patrões.
Os últimos meses têm decorrido em cima de iniciativas patronais de ataque à contratação coletiva e todos os direitos nela constantes, e despedimentos sob pretexto de falsas justificações de crise, em simultâneo com a arrecadação de lucros como nunca antes, como assumido diversas vezes.
A indústria conserveira sempre se apoiou, de forma inequívoca, nas características do povo das comunidades piscatórias, fomentando uma simbiose inigualável, por fomentar a interação de setores a montante e a jusante da frota do cerco, aproveitando a vivência das pessoas e o seu conhecimento no ramo, muito também pela necessidade de mão de obra intensiva de que ainda hoje necessita.
Foi nesta premissa social e cultural que, em todas as zonas de alta densidade da indústria conserveira, se foram construindo décadas de história. Histórias de transformação económica regional quase sempre alavancadas pela iniciativa reivindicativa de gente tão peculiar.
É precisamente este principal traço que os patrões da indústria tentam agora apagar.
Se, na recente iniciativa de Consagração do Dia Nacional da Conservas de Peixe pela Assembleia da República, por iniciativa da ANICP, assistimos a uma total inversão de pressupostos, fazendo crer que a indústria é que contribuiu para os hábitos alimentares do País e não o contrário, e apagando totalmente a alusão às iniciativas revolucionárias dos Trabalhadores, maioritariamente mulheres, que contribuíram de forma séria para o combate à discriminação salarial de género, os Patrões debruçam-se agora sobre aquilo que acreditam ser uma letargia generalizada do povo para proceder à transformação social do coletivo de trabalho das suas fábricas.
Numa rápida apreciação à realidade das maiores fábricas da indústria das conservas de peixe em Portugal, podemos observar vários eixos de transformação:
· Alienação do património nacional produtivo das conservas de peixe por via da venda do capital a investidores estrangeiros, sobretudo Espanhóis, que entendem e aproveitam o potencial de rendimento e lucro associado a uma indústria que se apoia em traços culturais e hábitos de alimentação saudáveis;
· Alteração do traço social, político e económico do universo de Trabalhadores por via do recurso à subcontratação sem motivos que o validem, da assunção plena da política de salário mínimo (que abrange já praticamente a totalidade dos trabalhadores), e ainda da precarização dos vínculos laborais;
Esta movimentação organizada de todos os Patrões leva já alguns anos de preparação e avanço, aproveitando também o facto de os proprietários, quer por via da sucessão geracional, quer pela venda a capital estrangeiro, não possuírem hoje quaisquer compromissos de equilíbrio social com os seus Trabalhadores ou rosto público para manter, e assumiu recentemente especial empenho no ataque à contratação coletiva do setor.
Com efeito, a última ofensiva dos patrões da indústria conserveira assenta na tentativa de descaracterização dos horários de trabalho, em tentativa descarada de forçar o recurso ao trabalho noturno, uma realidade historicamente arredada do setor.
Esta ofensiva tem assumido contornos de chantagem, assumindo capacidade financeira para o considerável reforço salarial dos seus Trabalhadores, mas apenas e só por troca com a perda de direitos, numa lógica corruptiva da normal evolução social.
Nas iniciativas de negociação, os responsáveis da associação patronal (ANICP) têm afirmado, de forma clara, capacidade para melhoria dos salários de forma considerável desde que em cedência de direitos.
É também por isso que se considera cínica, absurda e ofensiva a recente iniciativa de despedimento coletivo na GENCOAL, conserveira exportadora em Vila do Conde, recentemente tornada pública, com incidência seletiva.
Este é, portanto, um cenário de maior coragem dos patrões no ataque aos direitos dos Trabalhadores, convencidos de um cenário de falta de iniciativa reivindicativa e capacidade de resistência dos Trabalhadores que, em boa verdade, apenas se verifica naquelas onde não há, ainda, organização sindical ou, havendo, é mal conduzida e organizada.
A resposta a tamanho ataque aos Trabalhadores, à sua dignidade, e à sua subsistência, reside na organização coletiva, por via da sindicalização e ativação do espírito reivindicativo.
É urgente avançar na contraofensiva que não só defende os direitos dos Trabalhadores perante este ataque dos patrões, como potencia a conquista de melhores condições de trabalho, mais direitos, e melhores salários.
É na sindicalização que está o ponto de viragem para o cenário atual adverso do setor das conservas
Fonte: Sindicato dos Trabalhadores da agricultura e das indústrias de alimentação, bebidas e tabacos de Portugal