Médicos internos são ignorados pelo Governo e vítimas de abuso laboral em várias instituições
Os médicos internos não podem continuar a ser esquecidos, acordo atrás de desacordo, desacordo atrás de acordo. Ignorados em geral pelos sucessivos governos das duas últimas décadas, e este último em particular, continuam sem ver o internato reconhecido como parte integrante da carreira médica, têm salários incapazes de sustentar o custo de vida e assistem, paulatinamente, à desvalorização da sua formação e especialização médica.
Quando a falta de capacidade de resposta, sobretudo ao nível do serviço de urgência (SU), começou a ser indisfarçável, os médicos internos foram as primeiras vítimas, passando a recair sobre os seus ombros ainda mais responsabilidade, associada ao sacrifício da qualidade da sua formação, fruto da sobrecarga de trabalho.
Os médicos internos foram forçados à deslocação abusiva entre diferentes unidades de saúde para assegurar o funcionamento de SU e acesso da população a cuidados de saúde. Além disso, foram pressionados a assegurar escalas de SU externa para além do limite legal anual do trabalho suplementar, assim como a fazer urgência interna de áreas fora do âmbito do seu programa formativo, em desacordo com os seus conhecimentos, qualificações e competências. Para cúmulo, há falta de pagamento da majoração devida das horas suplementares.
De modo ilegal e persistente, a constituição das equipas de urgência tem estado abaixo dos mínimos previstos pela Ordem dos Médicos, e não raras vezes sem médicos especialistas no período noturno. Não podem ser os internos, desacompanhados no exercício das suas funções, os responsáveis por colmatar a falta de especialistas. Assim, vários Conselhos de Administração (CA) levam ao incumprimento das leges artis e, consequentemente, a qualidade, a prontidão e o rigor do ato médico, colocando uma vez mais em risco a segurança dos doentes e a efetivação do direito fundamental à proteção da saúde que a Constituição protege.
Cumulativamente, muitos internos viram alterações ilegais dos seus horários de trabalho, a prestação de seis dias por semana, sem direito aos dois dias de descanso semanal, obrigatório e complementar. E, em algumas instituições, não está a ser concedido o direito ao descanso com prejuízo de horário nos oito dias seguintes após trabalho efetuado aos domingos e feriados. Por último, muitos CA dificultam a aprovação de estágios dos médicos internos, se realizados fora da unidade onde estão a frequentar o internato médico.
Os números publicados ontem pela Ordem dos Médicos, relativos ao impacto do burnout entre os médicos internos, onde um em cada quatro jovens médicos apresenta sintomas graves de burnout e 55,3% está em risco de desenvolver a síndrome, são um sinal revelador e alarmante, reflexo dos abusos laborais a que os médicos internos são sujeitos.
A FNAM, através dos seus três sindicatos, tem desenvolvido ações para reverter o abuso a que muitos médicos internos são sujeitos nos seus locais de trabalho. E tem vindo a batalhar para a integração dos médicos internos no primeiro patamar da carreira médica, uma vez que eles são um terço dos médicos no SNS, assegurando, em boa medida, a capacidade de resposta do próprio SNS. Continuaremos a nossa luta pela defesa dos direitos de todos os médicos com a convicção que se impõe uma resposta adequada à realidade dos internos, não só na sua valorização salarial, mas sobretudo na sua valorização técnica e humana.
Ao futuro governo sugerimos que dê início a negociações urgentes à primeira hora do seu mandato, de forma a não desperdiçar o tempo que o mais recente Ministro da Saúde perdeu ao longo de 19 meses de negociações, sem competência para salvar a carreira médica, concretizando, também, as soluções que a FNAM tem para o Internato Médico, cujos profissionais serão o futuro do SNS.
Fonte: FNAM