Com o trabalho comunitário a que ficam obrigados os beneficiários do RSI o Governo está a violar a Convenção nº 29 da OIT, relativa a trabalho forçado, de 1930
Foi publicado o Decreto-Lei 221/2012, de 12 de Outubro, que regula o desenvolvimento de actividade socialmente útil pelos beneficiários do RSI e membros do respectivo agregado familiar.
A CGTP-IN manifestou a sua discordância relativamente à imposição da realização de trabalho comunitário pelos beneficiários do RSI, desde que a ideia começou a ser veiculada pelo Governo a pretexto de que os beneficiários do RSI «têm que devolver à sociedade uma parte do esforço que está a ser feito em seu benefício».
Conforme dissemos, então, a criação desta nova obrigação a cargo dos beneficiários do RSI é apenas mais uma peça da estratégia demagógica montada por este Governo para estigmatizar os beneficiários do RSI e subverter o fundamento da criação desta prestação constituindo a negação da solidariedade e da política social devida ao Estado de direito democrático.
De acordo com o diploma agora publicado, a actividade socialmente útil é a ocupação temporária a que ficam sujeitos os beneficiários do RSI e membros do respectivo agregado familiar entre os 18 e os 60 anos - algumas excepções relacionadas com o desenvolvimento de actividade profissional ou frequência de ensino, formação ou medida activa de emprego ou com a prestação de apoio indispensável e permanente de membro do agregado familiar, sendo notória a ausência de excepções no caso de pessoas que sofram de deficiência ou doença crónica incapacitante, por exemplo. A actividade deve ter a duração máxima de 15 horas semanais, distribuídas por no máximo por 3 dias úteis e não podendo ultrapassar a 6 horas diárias.
Esta actividade é desenvolvida a favor de entidades sem fins lucrativos ou do sector da economia social – IPSS, associações de utilidade pública, cooperativas e organismos da Administração pública, deve visar a satisfação de necessidades sociais e comunitárias e não deve consistir maioritariamente na realização de tarefas permanentes da instituição.
Em troca do seu trabalho, os beneficiários apenas têm direito a transporte, alimentação (esta apenas no caso de a actividade ter duração diária de pelo menos 4 horas) e seguro de acidentes pessoais da responsabilidade da entidade à qual prestam serviço. Em contrapartida ficam sujeitos a um conjunto extenso de deveres, inclusive um dever estrito de cumprimento de horário e de assiduidade com um regime de faltas em tudo idêntico aos dos trabalhadores por conta de outrem, cuja violação é punida com a perda da prestação.
Este verdadeiro dever de prestar trabalho – embora rotulado de desenvolvimento de actividade socialmente útil - corresponde a uma forma de trabalho forçado, de acordo com a definição constante da Convenção nº 29 da OIT, relativa a trabalho forçado, de 1930, cujo artigo 2º define como trabalho forçado ou obrigatório: «todo o trabalho ou serviço exigido a um indivíduo sob ameaça de qualquer castigo e para o qual o dito indivíduo não se tenha oferecido de livre vontade».
Por outro lado, as entidades referenciadas como potenciais beneficiárias desta actividade passam a dispor de uma reserva de mão-de-obra gratuita, para o desenvolvimento das mais variadas actividades que podem incluir o desenvolvimento de funções correspondentes a postos de trabalho permanentes e que se sobreponham às desenvolvidas pelos seus próprios trabalhadores, desde que não maioritariamente.
Aliás, é previsível que esta disposição da lei, que se limita a uma ambígua proibição parcial, dê origem a toda a espécie de abusos, incluindo na Administração pública, numa repetição alargada do escândalo que se verifica com o desenvolvimento do chamado trabalho socialmente necessário, titulado pelos contratos emprego-inserção, em que os beneficiários de prestações de desemprego (e também de RSI) são chamados a ocupar sistematicamente postos de trabalho permanentes, designadamente em serviços e organismos da administração pública central e local.
O Governo opta vincadamente por obrigar os cidadãos a prestar trabalho alegadamente voluntário, garantindo por essa via a determinadas organizações um reservatório de mão-de-obra gratuita, ao invés de promover a criação de emprego de qualidade com pagamento de salários justos para que os cidadãos deixem de necessitar de recorrer a prestações sociais para sobreviver.
A CGTP-IN rejeita mais esta medida do Governo que, numa situação de elevado desemprego, deveria primar pela implementação de políticas que assegurem o cumprimento do princípio constitucional do direito ao trabalho e de promoção do pleno emprego. A luta contra o desemprego, a precariedade e a exclusão, são flagelos sociais que exigem respostas firmes e urgentes, em sentido oposto às que têm sido postas em prática pela política de direita que têm, somente, agravado a situação em Portugal.
DIF/CGTP-IN
Lisboa, 15.10.2012