Posição da CGTP-IN
As previsões macroeconómicas apresentadas ontem pelo Ministro das Finanças apontam para um aprofundamento da crise económica, uma quebra no emprego e um aumento do desemprego. Os portugueses, os trabalhadores e a CGTP-IN exigem que sejam salvaguardados os princípios mais elementares de uma justa repartição dos sacrifícios, o que está longe de suceder com este imposto extraordinário. O país tem que encontrar caminhos para que deixem de ser sempre os mesmos – os trabalhadores, reformados e pensionistas – a serem chamados para ajudar a resolver os problemas do país.

 

 

Posição da CGTP-IN sobre a sobretaxa extraordinária de IRS, previsões macroeconómicas 2011/2012 e privatizações – 15/07/11

Mais crise e mais desemprego

As previsões macroeconómicas apresentadas ontem pelo Ministro das Finanças apontam para um aprofundamento da crise económica, uma quebra no emprego e um aumento do desemprego. O PIB deverá diminuir 2,3% em 2011 e 1,7% em 2012. A taxa de desemprego oficial deverá subir até 13,2% em 2012[1], esperando-se a destruição de 134 mil postos de trabalho neste dois anos (80 mil em 2011 e 54 mil em 2012), caso estas previsões se confirmem.

De acordo com estas previsões, todas as componentes da procura interna sofrerão recuos significativos, sendo o investimento aquela que terá a maior quebra (ultrapassa os 10% em 2011 e os 5% em 2012[2]), devido às dificuldades de obtenção de crédito e aos cortes no investimento público decididos pelo Governo no quadro de cortes da despesa pública que também afectarão significativamente o consumo público.

O consumo privado, a componente com maior peso no PIB (67%), diminuirá também nestes dois anos, devido a um menor poder de compra dos trabalhadores, dos pensionistas e população em geral, aumento do desemprego, restrições ao crédito, aumento dos impostos (IRS, IVA, IMI) e dos preços de bens e serviços essenciais (com reflexos também no aumento da inflação).

As exportações são o único factor positivo para a evolução do PIB, mas como se facilmente se constata, apesar de um aumento razoável (superior a 5% nos dois anos), não é suficiente para que o país cresça. Acresce que as previsões assentam num elevado grau de incerteza face à evolução da procura dos nossos principais clientes[3]. Veja-se a instabilidade económica e financeira da União Europeia, mas também dos Estado Unidos.

A análise da evolução do PIB e das determinantes do crescimento demonstram que a economia do país não deve apenas assentar no sector exportador – para mais num quadro em que todas as outras componentes do produto sofrem os efeitos negativos das políticas seguidas – devendo sim haver uma política de fomento dos sectores transaccionáveis que, aposte no aumento da produção interna para exportação, mas também para substituir importações, o que permitirá, ao mesmo tempo, diminuir a dependência face ao exterior e o défice externo, aumentar o emprego, diminuir o desemprego, aumentar o rendimento nacional e os salários e o consumo interno.

Se nada for feito para impedir a continuação destas políticas de asfixia da economia nacional, este será o resultado das medidas acordadas pelas troikas no quadro da intervenção do FMI/UE, no Programa de Governo e agora neste anúncio de mais sacrifícios aos portugueses por via do lançamento de mais uma medida profundamente injusta, como é a sobretaxa extraordinária em sede de IRS.

Privatizações privam o Estado de instrumentos estratégicos ao desenvolvimento e entregam-nas ao capital estrangeiro

O Ministro das Finanças reiterou o objectivo de privatizar empresas estratégicas da economia – Aeroportos de Portugal, TAP, CP carga, Galp, EDP, REN, CTT, RTP, o ramo segurador da CGD e Águas de Portugal – e ainda o BPN, prevendo acelerar o programa tanto quanto possível. Mas o Ministro foi mais longe que o habitual e admitiu que um dos objectivos é a entrega destas empresas ao capital estrangeiro o que, a concretizar-se, significaria a transferência de decisões com implicações no desenvolvimento do país para a mão de entidades que agem segundo uma lógica capitalista global e que em nada tem em conta os interesses nacionais.

Este amplo plano de privatizações e concessões mais não é do que o aprofundamento de uma política que vem sendo implementada desde o final dos anos 80/princípio de 90 e que, conforme a realidade o demonstra, não só não cumpre os objectivos anunciados de redução da dívida pública, modernização e melhoria da competitividade económica como são, em parte, responsáveis pela difícil situação com que o país está confrontado.

Com a crescente alienação de partes sociais das empresas, o Estado tem vindo a perder importantes fontes de receitas, com consequência no aumento da dívida pública e não na sua redução. O programa de novas privatizações inclui as empresas (EDP, REN, GALP…) que mais têm contribuído para as receitas do Estado. No actual contexto, as privatizações teriam lugar num quadro macroeconómico desfavorável, agravado pela pressão de vender rápido e até sem “preço mínimo” como é o caso do BPN. Por outro lado, é intenção do Governo o aumento das tarifas de muitos serviços, entre as quais as dos transportes públicos, o que é negativo para os trabalhadores e as populações.

Com as privatizações o Estado perde importantes instrumentos para realizar uma política que defenda os interesses nacionais, promova e potencie o crescimento económico e realize a coesão social e territorial.

No passado, a alienação de empresas conduziu, em muitos casos, à redução de inúmeros postos de trabalho qualificados e ao desaparecimento e definhamento de fileiras produtivas, empobrecendo desta forma o país através da diminuição da diversidade do perfil produtivo.

O aprofundamento do processo de privatizações coloca ainda em risco o preceito constitucional de subordinação do poder económico ao poder político, com a entrega de empresas produtoras de bens não transaccionáveis e com a agravante de parte das empresas e sectores privatizados estarem, já hoje, nas mãos de grandes grupos económicos estrangeiros.

Por isso a CGTP-IN exige a suspensão imediata do programa de privatizações e o desenvolvimento de um programa que permita o aumento da participação do Estado no capital das empresas estratégicas para o desenvolvimento do país (energia, comunicações, transportes, entre outras) e a utilização destas empresas para o crescimento económico e a garantia de serviços às populações.

Agravamento de IRS para trabalhadores e pensionistas

O Ministro das Finanças, na apresentação sobretaxa extraordinária em sede de IRS, afirmou que se trata de uma medida universal e que respeita o princípio da equidade social, mas no entender da CGTP-IN isto não corresponde à verdade.

Em primeiro lugar, porque na realidade é aos trabalhadores por conta de outrem e aos pensionistas que é exigido um maior esforço contributivo no pagamento deste imposto extraordinário. Efectivamente, ficam de fora desta tributação extraordinária os juros de depósitos, os dividendos (os lucros distribuídos aos accionistas) e outros rendimentos sujeitos a taxas especiais mas que não são englobados (o que sucede com a generalidade dos

contribuintes que não optam pelo englobamento de rendimentos), como ficam também fora deste esforço contributivo os lucros das empresas e, particularmente, os lucros dos grandes grupos económicos, das grandes empresas e do sector financeiro.

A sobretaxa anunciada incidirá sobre todos os portugueses desde que tenham rendimentos do trabalho, de reformas ou de pensões superiores ao valor do salário mínimo nacional (485 euros), e a taxa adicional uniforme de 3,5% incidirá igualmente sobre todos os níveis de rendimento colectável (depois de deduzido o valor do salário mínimo nacional), independentemente do nível de rendimento. Se a tributação dos cidadãos em sede de IRS, nos termos constitucionais, respeita o princípio da progressividade (os que têm mais rendimento pagam taxas de IRS superiores) não se compreende que esta medida do Governo não respeite este princípio e imponha assim, em termos relativos, um esforço mais elevado aos contribuintes de baixos rendimentos.

Por outro lado, ao contrário do que sustenta o Governo, o princípio da equidade social na austeridade também não é respeitado. Por um lado, porque os rendimentos de capital dos particulares (designadamente, juros e dividendos) e os rendimentos das empresas (lucros) não são afectados, e por outro, porque o esforço pedido aos portugueses de rendimentos mais baixos é, em termos relativos, superior ao dos portugueses de rendimentos mais elevados.

O limite de isenção considerado (o salário mínimo nacional) é objectivamente muito baixo, sobretudo tendo em conta que este se situa pouco acima do limiar de pobreza. Ora, de acordo com o que foi apresentado, será objecto de retenção na fonte a título de sobretaxa o subsídio de Natal de todos os trabalhadores dependentes e pensionistas cujo valor liquido não exceda €485 euros, isto é o valor do salário mínimo.

A CGTP-IN considera que, para respeitar efectivamente os princípios da universalidade e da equidade social, seria necessário que todos os rendimentos fossem convocados e não existem fundamentos técnicos para deixar de fora os rendimentos do capital ou para não reforçar o carácter progressivo desta sobretaxa ou deste imposto adicional, fazendo pagar relativamente mais e aumentando o esforço relativo a quem mais rendimentos aufere.

Finalmente, não podemos deixar de salientar que a retenção na fonte para efeitos desta sobretaxa, que será feita directamente sobre o subsídio de Natal dos trabalhadores dependentes e pensionistas abrangidos no seu âmbito de aplicação (os outros rendimentos abrangidos só pagarão mais tarde, em 2012), incide mesmo sobre aqueles que, depois de feito o apuramento final da sobretaxa, afinal nada tinham ou tinham menos a pagar. Significa isto que, na prática, todos os trabalhadores e pensionistas cujo subsídio de Natal seja superior ao valor do salário mínimo vão sofrer uma redução efectiva do seu rendimento disponível, num empréstimo forçado ao Estado.

Assim, quando o Governo e o Ministro das Finanças afirmam, por exemplo, que estão excluídos do pagamento desta sobretaxa 80% dos pensionistas do regime da segurança social e 65% dos agregados familiares, isto não significa que estas pessoas estão isentas do esforço, pois em termos imediatos a maioria delas vão efectivamente ter o seu subsídio de Natal reduzido, embora algumas possam vir a ser reembolsadas lá mais para meados do próximo ano.

Neste quadro, a CGTP-IN reafirma que estamos perante a mesma vontade política, que teima em não mudar, de fazer pagar sempre aos mesmos (trabalhadores e pensionistas) os sacrifícios para que o Estado arrecade mais receitas enquanto a outros, por razões não compreensíveis (estímulo às poupanças, estabilidade financeira ou dificuldades técnicas decorrentes do não englobamento de rendimentos), não lhes são exigidas essas responsabilidades. Uma vez mais sacrificam-se os fracos e não se enfrentam os poderosos.

Por outro lado, esta medida não deixa também de ter efeitos macroecómicos negativos, seja ao nível do consumo interno (principal componente do PIB), seja ao nível da poupança, que poderia ser canalizada para o sistema bancário, para a concessão de crédito, no quadro de produtos mais atractivos para os aforradores.

Os portugueses, os trabalhadores e a CGTP-IN exigem que sejam salvaguardados os princípios mais elementares de uma justa repartição dos sacrifícios, o que está longe de suceder com este imposto extraordinário. O país tem que encontrar caminhos para que deixem de ser sempre os mesmos – os trabalhadores, reformados e pensionistas – a serem chamados para ajudar a resolver os problemas do país.

Lisboa, 15 de Julho de 2011



[1] Admite-se que nas previsões para 2011 e 2012 tenha sido usada a nova série do Inquérito ao Emprego iniciada em 2011, embora o documento não esclareça. Caso contrário as previsões pecam por defeito.

[2] Previsão de quebra inferior à constante no Boletim Económico de Verão do Banco de Portugal (-10,8% em 2011 e -10% em 2012).

[3] No Boletim Económico de Verão/2011, o Banco de Portugal aponta para uma probabilidade superior a 50% das exportações virem a ser mais baixas do que o previsto.