Proposta de Lei Nº 182/XII

Com a alteração proposta, a possibilidade de saber qual a idade em que cada um de nós se poderá retirar da vida activa e qual o valor expectável da pensão a que teremos direito desaparece, criando instabilidade e incerteza quanto ao futuro e à qualidade de vida que poderemos ter na velhice.

 

Proposta de Lei Nº 182/XII

Procede à primeira alteração à Lei 4/2007, de 16 de Janeiro, que aprova as bases gerais do sistema de segurança social

(Separata nº 48, DAR, de 2 de Novembro de 2013)

Apreciação da CGTP-IN

 

Esta Proposta de Lei visa alterar alguns princípios estabelecidos na Lei de Bases da Segurança Social no que toca à idade normal de acesso à pensão de velhice e ao factor de sustentabilidade, de modo a permitir que a lei ordinária – no caso, o regime jurídico das pensões – venha a prever a possibilidade de alterar, sucessiva e constantemente, quer a idade normal de acesso à pensão de velhice, quer o ano de referência para cálculo do factor de sustentabilidade, e em consequência o valor da pensão a que os beneficiários terão direito.

A alteração proposta traduz-se, assim, na introdução de cláusulas abertas que permitirão aos Governos invocar, a seu bel prazer e conforme as suas conveniências, a evolução da esperança média de vida, a situação demográfica e/ou a sustentabilidade do sistema de segurança social, para modificar elementos essenciais do cálculo da pensão de velhice e, em última instância, de importância crucial para a vida dos cidadãos quando chegam ao final da sua vida activa.

Com a alteração proposta, a possibilidade de saber qual a idade em que cada um de nós se poderá retirar da vida activa e qual o valor expectável da pensão a que teremos direito desaparece, criando instabilidade e incerteza quanto ao futuro e à qualidade de vida que poderemos ter na velhice.

O regime de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem é um regime previdencial, contributivo, baseado nos princípios da contributividade e da solidariedade laboral e intergeracional. Isto significa que o sistema se baseia, por um lado, na existência de uma relação sinalagmática entre o montante das contribuições pagas ao longo da vida activa e o valor das prestações a que cada trabalhador terá direito quando da verificação das eventualidades cobertas e, por outro, no contrato estabelecido entre as sucessivas gerações de trabalhadores que vão contribuindo para o sistema.

Ora, a introdução de factores de incerteza neste domínio distorce os referidos princípios e altera as condições da relação jurídica de segurança social estabelecida entre os trabalhadores activos e reformados, por um lado, e o Estado, por outro.

Como é sabido, a CGTP-IN sempre discordou da introdução do factor de sustentabilidade no cálculo das pensões de velhice, por entender que a consideração deste factor de ponderação no cálculo das pensões de velhice determina uma redução muito significativa no valor destas pensões e uma quebra progressiva na respectiva taxa de substituição, que será cada vez mais acentuada à medida que a esperança média de vida aumenta, implicando uma contínua degradação da qualidade de vida e o empobrecimento gradual dos reformados e pensionistas.

A CGTP-IN considera que o aumento da esperança média de vida é, para todos os efeitos, um progresso da humanidade que, a par dos benefícios em que inegavelmente se traduz, convoca problemas novos para os quais a sociedade, como um todo e de forma solidária, deve encontrar respostas e soluções justas que não onerem excessiva ou exclusivamente este ou aquele grupo social. O pressuposto de que o aumento da esperança média de vida é um problema exclusivo dos trabalhadores, cujos custos só estes devem suportar, é insustentável e inaceitável.

A alteração proposta irá determinar uma nova quebra na taxa da substituição das pensões (a relação entre a pensão e o salário que o trabalhador recebia enquanto activo), o que determina uma quebra do nível de vida no momento de passagem à reforma, quando as pessoas tendem a ter mais gastos com a despesa de saúde, e uma fragilização da sua posição relativa face aos restantes grupos sociais, o que é particularmente evidente no momento actual em que esta posição tem vindo a ser cada vez mais fragilizada, por via das várias medidas aplicadas aos reformados e pensionistas, desde o congelamento e a redução do valor das pensões ao aumento brutal da carga tributária.

A CGTP-IN recorda que, segundo cálculos efectuados pela Comissão Europeia, Portugal é dos países onde, devido à introdução do factor de sustentabilidade, a taxa de substituição das pensões mais irá cair no futuro, sendo inclusivamente referido que esta situação pode representar o regresso da pobreza nos idosos abrangidos por pensões contributivas.

Lembramos também que, quando o factor de sustentabilidade foi criado, se argumentou que esta medida evitaria um aumento da idade de reforma. Ainda que a alteração proposta para já não determine directamente o aumento da idade normal de acesso à pensão de velhice, implica que as pessoas tenham de prolongar a sua vida activa a fim de terem direito à pensão completa. Sem esquecer que esta alteração do artigo 63º da Lei de Bases da Segurança Social abre de facto a porta ao aumento discricionário da idade normal de acesso à pensão.

Aliás, no Relatório do Orçamento do Estado para 2014, as referências feitas ao ajuste da idade de acesso à pensão de velhice com base no factor de sustentabilidade, embora algo ambíguas, deixam claro que, em 2014 vão ser introduzidas alterações que conduzem ao aumento efectivo da idade da reforma para os 66 anos, mas a partir de 2015 serão previstas novas regras, ainda mais restritivas, que tornarão definitivamente incerta a idade normal de acesso à pensão e consequentemente o próprio valor da pensão.

A CGTP-IN salienta que estas medidas não podem ser tomadas sob a alegação da sustentabilidade financeira da segurança social. Os factores hoje determinantes na sustentabilidade derivam da recessão económica e da política governamental, com destaque para a perda de contribuições, a diminuição de transferências do Orçamento de Estado, o aumento da despesa com as prestações de desemprego e, mais recentemente, a decisão do Governo de concentrar as aplicações do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) em títulos da dívida pública portuguesa, até ao limite de 90%, a fim de utilizarem este Fundo para fins diversos daquele para que foi constituído (servir de reserva para o pagamento de pensões).

Neste contexto, a CGTP-IN rejeita quaisquer medidas que, tal como a alteração agora proposta, tenham como objectivo último aumentar a idade normal de acesso à reforma, quer directamente quer através do agravamento dos efeitos da ponderação do factor de sustentabilidade no cálculo das pensões.

7 de Novembro de 2013