Escola pública democrática, condição de futuro

Mário Nogueira
Membro do Conselho Nacional

Camaradas,

No programa de ação aprovado em 2016 defendemos uma Escola Pública Democrática, como contributo para um futuro melhor e mais justo, reclamando mudanças que obrigavam a ruturas com políticas do passado, prosseguidas por PS, PSD e CDS. Políticas que, para uns apontavam para a privatização e para o outro, apesar do discurso em defesa da Escola Pública, passa por manter em níveis reduzidos o seu financiamento público, negando o discurso com a prática e desvalorizando os profissionais do setor. Em comum, PS, PSD e CDS apontam a municipalização como panaceia para os problemas, um erro tremendo que uns e outros se dispõem a cometer, encantados que andam com os reluzentes milhões de euros com que a União Europeia vai atapetando uma calçada feita de cascas de banana.

Com a luta dos professores, de todos os trabalhadores e profissionais das escolas e dos portugueses em geral obtiveram-se ganhos ao longo destes 4 anos. Insuficientes, é certo, mas importantes, como o fim das injeções ilegais de dinheiros públicos em colégios privados ou a distribuição gratuita de manuais escolares. Foram ganhos a que também não foi alheia a conjuntura política positiva que resultou das eleições de 2015 e do facto de o PS, em 2019, não ter alcançado maioria absoluta.

Se à esquerda do PS eram e continuam a ser muitas as propostas destinadas à resolução de problemas e ao aprofundamento de opções positivas, a verdade é que, salvo poucas exceções, a maioria delas é anulada por um governo que se justifica com o que (não) prevê o seu programa e com as imposições de Bruxelas às quais é mais fiel do que aos interesses e direitos da generalidade dos portugueses. Um governo que também se assume fiel depositário da caridosa política marcelista, que faz lembrar a que, há quase 50 anos, Barata Moura cantou:

O pobre no seu penar / Habitua-se a rastejar / E no campo ou na cidade / Faz da sua infelicidade / Alvo para os desportistas / Da caridade... E assim se brincava (e ainda brinca) à caridadezinha.

Na Educação, como em tantos outros setores da vida nacional, esperava-se mais do governo do PS, até pelas inéditas condições políticas criadas: admitiu-se a reversão de políticas que fragilizaram a Escola Pública, a resolução dos principais problemas que afetavam o exercício dos profissionais e o respeito pelos direitos laborais, incluindo os sindicais; em suma, esperava-se um efetivo investimento na Educação, a par de um profundo respeito pelas normas de relacionamento democrático.

Só que, terminada a anterior legislatura e aprovado o primeiro Orçamento do Estado da atual, a desilusão acentua-se: os salários sofreram forte desvalorização que se acentuará em 2020; as carreiras continuam por regularizar, mantendo-se o roubo de tempo de serviço, os obstáculos à progressão e as ultrapassagens; o envelhecimento avança de forma galopante sem que sejam tomadas medidas que o contrariem, enquanto milhares abandonam uma profissão da qual fogem os jovens estudantes; o desgaste provocado por múltiplos fatores, desde logo os abusivos e ilegais horários de trabalho impostos, está a agravar-se; a precariedade arrasta-se por não lhe ser dado um combate efetivo, e até o PREVPAP se transformou em pouco mais que uma farsa. Assim vai crescendo o desencanto num tempo em que os trabalhadores constatam que, para si, no máximo, são 23 cêntimos de aumento diário, enquanto para o capital é aos carros de mão: mais de 1,6 milhões ao dia para o Novo Banco, ou seja 70.000 euros à hora, e para as PPP são 3,8 milhões ao dia, isto é, mais de 2.600 euros ao minuto!

Também as escolas continuam a viver dias difíceis: continuam a faltar trabalhadores não docentes depois de concursos que pouco acrescentaram; a gestão das escolas continua à margem de elementares regras de organização e funcionamento democráticos; as condições de trabalho não melhoram, com turmas demasiado grandes e falta de recursos, incluindo para apoio adequado a todos os alunos que deles necessitam; muitas escolas continuam por requalificar e o letal amianto por ser removido; a violência sobre docentes e não docentes não merece a condenação devida de uma tutela que a desvaloriza e considera adequada a atual moldura penal.

Exigia-se uma atitude positiva de diálogo e negociação por parte do Ministério da Educação, mas temos precisamente o contrário. Verdadeiramente, não há ministro para a Educação e quando excecionalmente Tiago Brandão Rodrigues reúne com os sindicatos é para lhes dizer que é o governo que decide o que se negoceia, como se negoceia e qual o produto final da negociação. Tudo o que sair fora dessa lógica, segundo o governante, não é caminho mas beco sem saída.

A esta posição na área da Educação junta-se a ausência de uma política que valorize, de facto, a Ciência, a Tecnologia e o Ensino Superior; junta-se a convergência do PS com PSD e CDS para manter normas gravosas do Código de Trabalho que impedem a negociação de um contrato coletivo de trabalho que respeite os direitos dos docentes do ensino privado e valorize o seu exercício profissional. E se tem sido de desrespeito a atitude do governo para com os profissionais no ativo, diferente não tem sido para os já aposentados, confrontados que são com políticas que arrastam velhos problemas e criam novos.

Como dar a volta a tão difícil e complexa situação? Não há outro caminho que não seja o da ação e luta reivindicativas. E é nestes tempos de maiores dificuldades, em que uns desanimam e outros se acomodam, em que o medo de uma alternativa ainda mais desfavorável se apodera de alguns, enquanto vários já vão indiciando descrença, que cresce de importância dos sindicatos, para que não se cale o protesto, para que a luta não abandone o espaço público, para organizar e dar mais força à luta dos trabalhadores.

Para o governo, os trabalhadores deverão contentar-se com pouco porque é melhor que nada, ao mesmo tempo que vai gerindo expetativas em relação ao futuro como se estas, de tanto adiamento, não se fossem apagando. Não podemos ficar reféns de taticismos políticos e, com propostas concretas, temos de reafirmar que há mais cor para além da rosa e da laranja, mas, ao mesmo tempo, lembrar que o negro de outros tempos, por mais popularucho que seja, mantém o fedor dos crimes que cometeu.

Sejamos pelo espectro de cores, embora sem deixar que elas se juntem e, qual disco de Newton, se transformem em linha branca. Ajudemos a mantê-las separadas, cada uma diferente da outra, e avivemos, com a nossa ação, o vermelho dos cravos que continua a unir Abril a Maio. Não há que hesitar, há é que levar por diante, aprofundando, o nosso projeto sindical de classe e com a força da nossa luta contribuir para um futuro melhor e uma governação que respeite quem trabalha.

Viva o XIV Congresso da CGTP- Intersindical Nacional

Vivam os trabalhadores e trabalhadoras de Portugal

Seixal, 15 de Fevereiro de 2020

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