O Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza assinala-se, em Portugal, num preocupante quadro social marcado pela existência de milhões de portugueses e suas famílias em risco de pobreza, ao mesmo tempo que está em crescimento o número dos que se encontram em situação de pobreza absoluta.

Portugal tem um grave problema de pobreza, de carácter persistente, apresentando um dos mais elevados níveis da União Europeia, situação que se tem vindo a agravar nos últimos anos em consequência da política de exploração e empobrecimento.

Em 2012, a população em risco de pobreza e exclusão social era de 27,4% (mais de 2,8 milhões de pessoas), correspondendo a uma evolução claramente ascendente desde 2011.

Esta percentagem global de 27,4% em 2012 junta realidades diferentes, que nem sempre coincidem, a pobreza e a exclusão social. Se considerarmos apenas a pobreza definida nos termos oficiais (isto é, as pessoas que vivem abaixo do limiar de rendimento definido - 60% de um rendimento médio equivalente) constatamos grandes diferenciações sociais. A taxa de pobreza oscila entre 10,5% para os empregados e 40,2% para os desempregados, passando por 12,8% para os reformados.

Olhando para estas diferenciações, constatamos uma deslocação da pobreza da população mais idosa, para pessoas activas, quer empregadas, quer desempregadas. Isto evidência, por um lado, o baixo nível dos salários em Portugal – recorde-se que cerca de meio milhão de trabalhadores aufere o Salário Mínimo Nacional (SMN), que esteve congelado (€485) desde 2011, num valor líquido (€432), ou seja, muito próximo do limiar da pobreza. O SMN foi agora ligeiramente elevado para um valor de (€505) o que resulta num valor líquido de (€449), ou seja, na proximidade do limiar de pobreza, prolongando assim uma situação igualmente inadmissível, de que, mesmo trabalhando, estes trabalhadores continuam pobres; – e, por outro lado, a insuficiência do sistema de protecção social no desemprego, sendo que mais de metade do total dos trabalhadores desempregados não tem acesso a qualquer protecção social.

Entre os grupos mais vulneráveis à pobreza estão as crianças – segundo dados recentes do Eurostat, as crianças em risco de pobreza e de exclusão social constituem 28,6% das pessoas com menos de 18 anos.

Estes dados são corroborados pelos Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, divulgado ontem pelo INE, que indica que a população infantil2 é a mais exposta a situações de pobreza e exclusão social (31,6% em 2012), sendo este o grupo em que essa realidade mais cresceu no nosso país.

As transferências sociais têm um importante impacto positivo na redução da pobreza – sem estas transferências a taxa de pobreza atingiria os 47% da população – o que significa que a redução destas transferências tem contribuído para um aumento da pobreza em todos os grupos afectados.

Assim, a redução generalizada das prestações sociais, em especial daquelas com maior incidência nas famílias, como sejam o abono de família e o apoio da acção social escolar (que foram das prestações que mais reduções sofreram), mas também das prestações substitutivas de rendimentos de trabalho perdidos, como as prestações de desemprego, as atribuídas em situação de maior carência, como o Rendimento Social de Inserção (RSI), estão a contribuir fortemente para que, na grave situação de crise económica e social em que nos encontramos, com elevadas taxas de desemprego, aumentos brutais de impostos e do preço dos bens essenciais, aliados a uma redução generalizada dos salários, se caminhe para um empobrecimento generalizado da população, o que significa que as pessoas mais vulneráveis na sociedade, como é o caso das crianças, fiquem numa situação ainda mais difícil.

Nas prestações não contributivas destaca-se a brutal descida do número de beneficiários do abono de família e RSI. Entre 2009 e Agosto de 2014, cerca de 680 mil crianças e jovens perderam o abono de família, enquanto neste mesmo período 266 mil beneficiários perderam o acesso à prestação do RSI.

Em suma, Portugal está mais pobre em resultado da política de direita, responsável pela destruição de emprego e do aumento da precariedade no trabalho, pela diminuição do nível de vida devido aos cortes e à diminuição nos salários, nas pensões e outras prestações da segurança social e ao agravamento dos impostos sobre os rendimentos do trabalho e pensões.

É-se pobre a partir de um nível de rendimento cada vez mais baixo. Em 2009 para ser pobre era preciso ter um rendimento inferior a 434 euros; em 2012 já bastava ser inferior a 408 euros.

A pobreza é também mais intensa. Este indicador mede a insuficiência de recursos dos pobres (ser pobre e viver com um euro é diferente de ser pobre e viver com 400 euros), a qual passou de 22,7% em 2009, antes da aplicação das políticas "ditas de austeridade", para 27,3% em 2012. Entre a população infantil cresceu ainda mais, atingindo os 33,1%.

Os dados do INE mostram também a realidade de uma população em que mais de 40% (43,2%) das famílias não tem meios para enfrentar uma despesa inesperada de 400 euros sem recorrer a um empréstimo, em que quase 1/3 (28%) não tem capacidade para manter a casa adequadamente aquecida e em que 60% (59,8%) não pode pagar uma semana de férias por ano fora de casa.

Entretanto, o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza é marcado pela apresentação pelo Governo PSD/CDS-PP da proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2015, alicerçado no prosseguimento da política de exploração e empobrecimento. O Governo pretende cortar mais de 1 milhão e 100 mil euros face a 2014 na despesa com subsídio de desemprego e apoio ao emprego (-243 M€), complemento solidário de idosos (-14 M€), pensões (-9 M€), Rendimento Social de Inserção (-8 M€), abono de família (-6 M€), ao mesmo tempo que têm intenção de diminuir em 24 M€ as transferências do OE para cumprimento da lei de bases da segurança social.

Além disso, pretende ainda introduzir aquilo a que chama "um tecto global para as prestações sociais não contributivas substitutivas de rendimentos do trabalho". Sem que se saiba ainda exactamente o que está aqui em causa, não restam dúvidas que se trata de uma medida que pretende atingir os grupos mais vulneráveis da nossa sociedade, contribuindo para o aprofundamento da pobreza e da exclusão social em Portugal. O que, combinado com o generalizado aumento do custo de vida, e novas reduções nas transferências sociais, representa uma deliberada opção de classe pela acentuação das injustiças e desigualdades na distribuição do rendimento nacional, aumentando o fosso entre a pobreza da maioria da população e a acumulação da riqueza e dos privilégios de uma minoria social – os grupos económicos e financeiros.

Neste Dia Internacional da Erradicação da Pobreza, o Governo do PSD/CDS-PP, não só impõe a continuidade da política de direita, como mantém e agrava os sacrifícios, projectando uma nova fase da ofensiva com o objectivo de intensificar ainda mais a exploração, cujas graves consequências sociais são inequívocas e estão à vista nos números que espelham o agravamento da pobreza, da exclusão social e das desigualdades, resultando num verdadeiro atentado aos direitos humanos.

Neste contexto adverso para os trabalhadores e o povo, a CGTP-IN reitera, que é necessário e é possível resistir, lutar e vencer muitas batalhas, até derrotar definitivamente este Governo e a política de direita, e criar as condições para uma alternativa política de esquerda e soberana que retome os valores e os direitos de Abril no futuro de Portugal.

DIF/CGTP-IN

Lisboa, 17.10.2014