A discussão na especialidade da Proposta de Orçamento do Estado para 2018 (OE2018) constitui uma oportunidade para dar centralidade a políticas que priorizem a resposta aos problemas dos trabalhadores, das populações e do país.

Apesar de se constatar uma evolução na reposição de rendimentos e direitos, o OE2018 tem necessariamente de ir muito mais longe no que concerne à melhoria dos salários, das progressões e carreiras profissionais na Administração Pública, bem como ao nível da política fiscal, das pensões e protecção social, dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde, Escola Pública, Justiça e Poder Local democrático.

É neste contexto que se justifica e exige que o Governo assegure no imediato o reforço das verbas previstas na proposta de OE para apoiar as populações das regiões mais devastadas pelos incêndios e inicie, desde já, um processo de reordenamento do território que combata as assimetrias e a desertificação com vista a concretizar a tão prometida e nunca concretizada regionalização, instrumento central para a promoção de uma verdadeira coesão económica, social e territorial do país.

Romper com os constrangimentos do Tratado Orçamental e do Semestre Europeu

Este é um OE que tem de colocar os direitos fundamentais dos trabalhadores e das famílias, assim como o interesse estratégico do desenvolvimento do país acima do Tratado Orçamental e da obsessão do défice que condiciona o investimento público, limita a capacidade de resposta dos serviços públicos às necessidades das populações e secundariza os direitos dos assalariados em geral e os do sector público em particular.

A CGTP-IN tem vindo a denunciar a contradição entre a aposta no desenvolvimento de Portugal e a opção por seguir as "orientações" externas, sendo este um paradoxo cada vez mais difícil de evitar. Desde logo, torna-se imperiosa uma renegociação da dívida, num quadro em que os juros suportados pelo erário público transformam um superavit orçamental previsto para o final de 2018 de mais de 5,3 mil milhões de euros, num défice de quase 2 mil milhões de euros continuando assim a rapina ao excedente acumulado em saldo primário desde 2014.

Valorizar o trabalho e os trabalhadores

A melhoria da situação económica do país, exige medidas de reposição mais ousadas e a implementação de outras que rompam com décadas em que se cristalizou o modelo assente em baixos salários, precariedade dos vínculos laborais e uma produção que se traduz num baixo valor acrescentado.

A CGTP-IN considera que se pode e deve ir mais longe em várias áreas, designadamente no cumprimento do princípio da actualização anual dos salários e na reposição e progressão das carreiras e dos trabalhadores da administração pública, na melhoria da proteção social e no desagravamento fiscal dos rendimentos do trabalho e pensões. Reconhecendo-se e valorizando-se alguns progressos feitos, consideramos que o processo de devolução de direitos e rendimentos tem que ser acelerado. Além de ser justo que assim seja, os dados oficiais indicam que no 1º semestre de 2017 as remunerações nominais por trabalhador têm sido negativas (-0,4% em termos homólogos).

Por outro lado, como o ano de 2017 está a comprovar, a procura interna é um elemento insubstituível para o relançamento da economia. O abrandamento do ritmo de crescimento previsto para 2018 deve-se à insuficiência da aposta na procura interna, com uma diminuição dos ritmos de crescimento do investimento e do consumo privado e uma nova redução do consumo público. Segundo as projeções constantes no OE2018, as opções assumidas pelo Governo PS - ao invés de incrementar de forma robusta os salários e os rendimentos, de inverter o declínio no consumo público e de intensificar o investimento para repor os níveis que a economia precisa para o relançamento da produção nacional – continuam a priorizar a redução do défice para níveis incompatíveis com as dificuldades e as necessidades de quem trabalha e vive em Portugal.

Tal como a CGTP-IN vem advertindo, é imperiosa uma aposta na valorização dos rendimentos do trabalho, na qualidade dos serviços públicos e funções sociais do Estado e num impulso que potencie a dinamização de outro perfil produtivo, o que implica a remoção dos cerceamentos impostos pelas regras ingerências e chantagens externas e internas, que condenam o país à extorsão de recursos e o deixam refém da ditadura do défice e da opressão da dívida, que condicionam gravemente o seu desenvolvimento económico e social.

Há alternativas para reduzir a despesa supérflua e arrecadar mais verbas em impostos para fazer face às responsabilidades do Estado.

A CGTP-IN defende:

1 - A renegociação da dívida nos seus prazos montantes e juros, libertando parte dos mais de 7 mil milhões de euros pagos em juros para o investimento público e a resposta às necessidades da população;

2 – Uma renegociação das PPP rodoviárias que desonere o Estado dos elevados encargos que estas comportam. O valor inscrito como despesa líquida em 2018 de 1.171 milhões €, já com o impacto estimado da acção do Governo na renegociação das PPP, é superior em mais de 40 milhões de euros que o previsto para 2018 no relatório do OE de 2017;

As taxas de rentabilidade destas PPP (em média cerca de 8%), os contratos leoninos efectuados e o logro das renegociações conduzidas pelo Governo anterior, têm como resultado encargos líquidos sempre crescentes e revistos em alta de Orçamento para Orçamento;

3 – Que os 850 milhões de euros orçamentados para o fundo de resolução devem ser libertos para outras funções, devendo ser os accionistas do sector financeiro a contribuir para a resolução dos problemas por eles criado.

4 – A incidência do IRC nos lucros efectivos gerados pelas empresas, aproximando o resultado contabilístico da matéria colectável, o que possibilitaria uma receita adicional de 3,1 mil milhões de euros.

DESIGNAÇÃO

2013

2014

2015

       RESULTADO LÍQUIDO DO PERÍODO

26.223

29.941

32.214

MATÉRIA COLETÁVEL

14.835

17.613

19.031

IRC LIQUIDADO

2.779

3.559

3.631

IRC LIQUIDADO com Proposta da CGTP-IN*

6.556

6.886

6.765

Aumento da Receita fiscal

3.777

3.328

3.134

FONTE: AT; * assumindo as taxas de IRC em vigor em cada ano (2013 – 25%; 2014 – 23; 21015 – 21%).

5 – A intensificação da taxação do capital. A contribuição do sector energético, para além de ainda não ter sido efectivada (num tratamento desigual perante as dívidas ao fisco destes contribuintes em relação à generalidade da população – que "primeiro paga e depois reclama"), apresenta valores perfeitamente irrisórios (120 milhões de euros).

A CGTP-IN entende que os rendimentos do capital devem ter o mesmo tratamento que aqueles que são oriundos do trabalho, com o seu englobamento obrigatório no rendimento total.

Partindo do exemplo dos dividendos distribuídos aos grandes accionistas de três das maiores empresas do sector energético (REN, GALP e EDP) a operar em Portugal (na sua maioria estrangeiros que levam estes dividendos fora de Portugal), o englobamento dos rendimentos permitiria uma receita adicional de mais de 231 milhões de euros. A generalização desta medida a toda a economia, possibilitava uma receita fiscal superior a 2 220 milhões de euros.

 

Dividendos pagos

IRS 28%*

IRS Englobamento

Ganho Orçamental

EDP

676.459.000 €

189.408.520 €

324.700.320 €

135.291.800 €

GALP

387.409.000 €

108.474.520 €

185.956.320 €

77.481.800 €

REN

91.314.000 €

25.567.920 €

43.830.720 €

18.262.800 €

SOMA

1.155.182.000 €

323.450.960 €

554.487.360 €

231.036.400 €

FONTE: Relatórios e contas de 2016 da EDP, GALP e REN.

*A taxa efectiva do imposto sobre dividendos, em virtude da legislação em vigor, é muito inferior aos 28%, pelo que o ganho orçamental será superior à estimativa de 231M€.

6 – A introdução de uma taxa de 0,25% sobre as transacções financeiras, com uma receita potencial superior a 1,1 mil milhões de euros.

Lisboa, 23 de Outubro de 2017